Bosque com remanescentes de Floresta com Araucária pode ser derrubado em Ponta Grossa para dar lugar a prédio de luxo

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Área é uma das últimas naturais que ainda sobrevive no espaço urbano de Ponta Grossa_Grupo Fauna
Área é uma das últimas naturais que ainda sobrevivem no espaço urbano de Ponta Grossa_Grupo Fauna

Ponta Grossa, na região dos Campos Gerais do Paraná, continua no centro das atenções quando o assunto é a aparente busca pela fragilização da proteção da biodiversidade por setores econômicos em prol da conquista de vantagens financeiras imediatas.

Depois de ganhar atenção estadual e nacional desde que um Projeto de Lei pensado por deputados da Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP) para propor a redução de 70% da APA da Escarpa Devoniana começou a ser discutido, o município voltou a ganhar a atenção da opinião pública. Agora, porque um bosque que concentra mais de cem árvores, algumas nativas da Floresta com Araucária – ecossistema associado ao bioma Mata Atlântica – pode ir ao chão. A área, conhecida como Parque Honório, tem cinco mil metros quadrados e está para ser suprimida para dar lugar a um prédio de alto padrão e 50 andares: o Vogue Square Garden, da Construtora LCS.

Recentemente, o Iplan (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Ponta Grossa) aprovou o projeto e o alvará para a construção do empreendimento e consequente derrubada da mata. O próximo passo deve ser a concessão, por parte da prefeitura de Ponta Grossa, de licenciamentos que autorizem o corte das árvores. Até o momento, segundo a prefeitura, isso ainda não foi feito. Pode, no entanto, acontecer em breve, já que o IAP (Instituto Ambiental do Paraná) incentiva cada vez mais que municípios paranaenses tenham autonomia para fazer as concessões, isentando-se, com isso, de uma responsabilidade que era sua.

Projeto do Vogue Square Garden_Divulgação
Projeto do Vogue Square Garden_Divulgação

A estratégia é bastante polêmica e prejudicial à conservação de áreas naturais, já que não são todos os municípios com condições e corpo técnico suficiente para avaliar com qualidade cada caso.

Há 15 anos, supressão do bosque já foi negada

Em 2002, a supressão do Parque Honório foi solicitada pelo Ministério Público, que havia adquirido uma área adjacente ao terreno em questão para construir a nova sede no município, mas, por na época reconhecer a importância de manter a vegetação do local em pé, o IAP negou o pedido de construção. Um protocolo do Instituto de 2005 apontou que “a vegetação em questão foi declarada de preservação permanente por ato do poder público municipal”.

Em entrevista à imprensa, entretanto, o arquiteto, urbanista e incorporador Luiz Eduardo Carvalho da Silveira, fundador da Construtora LCS, afirmou que já está com o alvará do Iplan para a construção em mãos e que este é um “assunto encerrado”.

“A cidade, com área urbana bastante carente de espaços naturais minimamente conservados, vai ser ainda mais prejudicada se a obra for iniciada”, defende Gilson Burigo, professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). O local já está cercado por tapumes, o que indica que a degradação pode não demorar a começar.

A situação foi encaminhada via Observatório de Justiça e Conservação ao Ministério Público do Paraná, que solicitou que o promotor do Meio Ambiente de Ponta Grossa, Dr. Honorino Tremea analise o caso. A assessoria de imprensa do MPE informou que o promotor está de férias e que assim que retornar às atividades, na semana do dia 24, dedicará a devida atenção ao assunto.

Espécies ameaçadas de extinção, como imbuias e canela-preta, podem não ter sido listadas pelo estudo atual de análise arbórea_Grupo Fauna

Carência de informações deixa dúvidas sobre credibilidade de dados sobre a área

Em 2016, por pressão dos moradores, uma audiência pública foi feita em Ponta Grossa para discutir a construção do prédio com a sociedade. Após esse encontro, uma nova audiência foi solicitada pelo representante dos moradores do entorno, Mauricio Assad à prefeitura do município para sanar dúvidas que, na primeira, não foram esclarecidas, junto com uma análise sobre faltas observadas no Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV).

“O pedido para uma nova audiência não foi aceito, mas um novo EIV foi feito”, conta Isabele Futerko, integrante da ONG Grupo Fauna. Para ela, o segundo estudo, apesar de mais completo que o primeiro, ainda deixa muito a desejar em termos de detalhamento das espécies que vivem no bosque. “Não são detalhados os níveis de sucessão vegetal, por exemplo. O levantamento mostra apenas quantas árvores existem no local, que são em torno de 100. Além disso, a análise foi feita por um profissional contratado pelo empreendedor interessado na construção do prédio. Precisamos de algo mais completo e isento”, defende. O segundo estudo também não apresentou levantamento das plantas que vivem no local ou os métodos empregados na análise.

Após os questionamentos, um novo profissional foi contratado para fazer outro levantamento mais criterioso. Os resultados desse terceiro laudo devem sair até o final de julho.

O proprietário do terreno defende que o dano da derrubada do bosque poderá ser compensado por investimentos na ordem de R$ R$ 433,9 mil na execução de um projeto paisagístico no Lago de Olarias. Os aportes seriam feitos atendendo a pedidos de compensação ambiental indicados pelo Iplan.

Clóvis Borges, diretor da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), no entanto, lembra que o valor de áreas naturais urbanas para o fornecimento de mais qualidade de vida à população deveria ser mais valorizado. “Os esforços de compensação não seriam consonantes com o prejuízo que a supressão das áreas naturais em ambientes urbanos representa, especialmente, no longo prazo”, defende.

Exemplares ameaçados de extinção podem não ter sido catalogados pelo estudo atual

Na lista de espécies arbóreas do segundo Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), estão listadas 26 espécies diferentes de árvores, a maioria, exóticas ou nativas em estágio inicial o médio de sucessão. Mas de acordo com pesquisadores do Grupo Fauna e da UEPG, existem outras – inclusive exemplares ameaçados de extinção – que não foram catalogados pelo estudo. No EIV, ao menos quatro indivíduos presentes na área foram apontados como “espécie não identificada” (NI) e, para a professora Rosemeri Moro, da UEPG, novas descobertas podem ser feitas na terceira análise que está sendo produzida.

Em 2002, Rosemeri foi a responsável por um levantamento arbóreo que identificou espécies naturais da Floresta com Araucária e altamente pressionadas pela exploração irresponsável, como a imbuia e a canela-preta, por exemplo. “Na época, identificamos diversas imbuias e, pelo menos, uma canela-preta no local e nenhuma dessas espécies está citada na lista do segundo EIV”, diz.

Entre as espécies já listadas no atual levantamento estão apenas Abacateiro, Açoita-cavalo Canela-amerela, Canela-guaicá, Canelinha, Canjerana, Casca-d’nata, Cedro, Cinzeiro-preto, Figo-do-mato, Figueira-do-mato, Fumeiro, Fumo-bravo, Jacarandá-bico-de-pato, Jasmin, Juvevê, Leiteiro, Limoeiro, Mamoeiro-do-campo, Maria-faceira, Pau-fava, Pau-pólvora, Pindaíba, Sapuva, Vacunzeiro.

 

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