De cada dez brasileiros, sete vivem nas cidades. Esses números ajudam a entender por que o nome do principal programa sobre questões ambientais atualmente na mídia é Cidades e Soluções, exibido pela GloboNews e Canal Futura.
Agora, os dez anos da atração deram forma ao livro “Cidades e Soluções – como construir uma sociedade sustentável”, que será lançado hoje (05), no Dia do Meio Ambiente, pela Editora Leya.
O lançamento acontece às 19h30, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon, no Rio de Janeiro.
Escrito pelo jornalista e editor-chefe do programa, André Trigueiro – que também é colunista do G1, da Folha de São Paulo e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC-Rio, – a obra de mais de 300 páginas mostra que, apesar dos desafios, existem muitos projetos bem sucedidos em defesa do meio ambiente no Brasil.
Trigueiro falou com exclusividade do Observatório de Justiça e Conservação e comentou o que representa a degradação da Floresta com Araucária e Campos Naturais.
Que experiência o leitor vai ter ao ler o novo livro?
O livro é inspirado nos dez anos do programa Cidades e Soluções. São momentos importantes das 400 edições, com exemplos de soluções sustentáveis no Brasil e no mundo, que promovem a qualidade de vida, reduzem o desperdício e também denunciam o risco de um colapso ambiental. É necessário que aconteçam mudanças em prol de um mundo melhor e mais justo. Mas o livro vai além do programa, atualizando dados, trazendo novas informações e lembrando as principais entrevistas já feitas.
As cidades têm solução? Entre assuntos como transporte, lixo, zoneamento, quais são os maiores problemas?
Dez anos é um tempo histórico muito pequeno para a gente dizer que um problema deixou de existir. Mas houve, sim, importantes mudanças no setor de energia, no reuso de água, na tentativa de conter a destruição da biodiversidade e na denúncia de políticas frouxas sobre agrotóxicos. O Brasil é um dos países com a maior taxa de urbanização do mundo: 75% das pessoas vivem nas cidades, onde não há planejamento. E é aí que surge o caos. Uma das funções do programa e também do livro é mostrar onde as coisas estão acontecendo de maneira criativa, inovadora, inteligente e não necessariamente com custo mais elevado.
Como você vê a utilização de agrotóxicos no Brasil?
É preciso uma vigilância sanitária com critérios mais técnicos, porque há setores que não trabalham no sentido da precaução. O Brasil se tornou um território muito aberto a esse tipo de indústria, o que é péssimo para a saúde e o meio ambiente. Nós temos uma fragilidade imensa na fiscalização, reconhecida pelo próprio Ministério da Agricultura e entre estados e municípios, existe uma disputa entre políticos nem sempre honrados pela indicação de cargos na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Temos uma situação caótica que precisa ser analisada.
Que soluções encontrou durante o tempo de programa que se destacam? De onde chegam os melhores exemplos?
Tem muita coisa boa. Houve um avanço avassalador nas energias renováveis no Brasil e no mundo. Em dez anos, o Brasil passou de uma presença insignificante na energia eólica para 52 milhões de brasileiros que hoje se beneficiam dessa fonte energética. É quase uma Belo Monte de capacidade. Na energia solar, nos últimos cinco anos, passamos de um telhado solar homologado na Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) para dez mil. Existe uma tentativa de o Brasil avançar no reuso de água de esgoto, há um avanço tímido em construções sustentáveis e tem ainda o aumento das bicicletas no transporte nas cidades. A lista é grande, está tudo no livro.
O Paraná é um estado com forte domínio do agronegócio e interferência de setor interessados nessa prática em órgãos do governo, inclusive, nos que deveriam garantir a proteção da biodiversidade. Como você enxerga a sinergia entre desenvolvimento e conservação?
Não vejo problema se a gente conseguir nortear os interesses do agronegócio com os protocolos éticos e seguros sobre o uso de manejo do solo. É preciso que tenha clareza sobre a “pegada ecológica” que está sendo deixada quando se conduz alguma prática exploratória e que se conheça a vocação de determinada área para o plantio de soja, para a pecuária ou proteção ambiental, por exemplo. O Brasil é um país abençoado. Dá para compatibilizar o interesse ambiental com a produção agrícola, criação de gado e mineração, com tanto que os critérios de proteção à biodiversidade necessários sejam assegurados pelo poder público e respeitados pela sociedade. É errado pensar que a agenda da conservação conflita com a agenda da produção rural. Existe uma agenda comum com vários programas públicos, principalmente da Embrapa, que promovem o uso dos recursos naturais em benefício dos produtores. Isso não é um problema, pode ser a solução, mas existe uma visão muito equivocada de que não se deve respeitar as áreas verdes no Brasil sob o pretexto de “alimentar o mundo”. Esse é um discurso que não faz sentido. A conta precisa ser feita de maneira sensata.
No Paraná e em estados como Santa Catarina e Rio Grande do Sul, ecossistemas como Floresta com Araucária e os Campos Naturais estão altamente ameaçados por anos de exploração dos recursos naturais sem limites e omissão do poder público e fiscalizar com eficiência e rigor irregularidades. Como enxerga essa questão?
A vegetação remanescente inspira cuidados e existem riscos claros. Sem o cuidado necessário essas formações vegetais vão desaparecer. E seria lamentável o Paraná ou os outros estados não terem a competência de proteger áreas tão importantes. Não é só uma questão de tradição, nem apenas de representação da cultura dessa parte do país. Os efeitos do problema serão ainda mais dramáticos para toda a sociedade, que perde muito com a supressão das áreas naturais. É preciso lembrar a denúncia do professor Aziz Ab’Saber, maior geógrafo do Brasil, sobre o Código Florestal: falta ciência no Código! Ninguém quer inibir o trabalho do produtor rural, quando feito de maneira coerente. Mas o que hoje parece inofensivo e uma consequência necessária para o desenvolvimento ainda vai se revelar um imenso problema.
A conservação da biodiversidade ainda não ganha o mesmo destaque em comparação a temas de ordem política ou econômica nos grandes veículos. Como você vê o futuro do jornalismo ambiental?
O caminho que a garotada já está percorrendo não depende dos grandes veículos. Há uma mudança tecnológica, de modelos de negócio, de hábitos da juventude que não vê mais tanta televisão, ouve rádio ou consome jornal. Estamos vivendo uma transição de plataformas de comunicação. As redes sociais e mídias alternativas já são provedoras de conteúdo, muitas vezes, de bastante qualidade. É outro mundo e a gente precisa enxergar essa mudança como uma nova forma fazer notícia e levar informação à sociedade.
Para terminar, como é o cidadão André Trigueiro em relação ao meio ambiente? Quais são os cuidados básicos que você costuma tomar em respeito à proteção da biodiversidade?
Na minha casa, madeira ou é de demolição ou é certificada. Existe um uso parcimonioso de água e eu só mando para aterro sanitário os rejeitos. Aproveito matéria orgânica em minha própria compostagem e pago por um serviço que vem de bicicleta buscar o que sobrou da matéria orgânica para fazer adubo. Também separo o lixo que a prefeitura recolhe. Sou muito atento à ideia do consumo consciente e entendo que faz a diferença praticar aquilo que a gente defende.
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