Os pinheiros agonizam

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Foto_Zig Koch

Em 2005, durante a 44ª Reunião Extraordinária do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), realizada na cidade de Campos do Jordão (SP), o Ministério do Meio Ambiente escolheu a Araucária, o pinheiro brasileiro, como tema do encontro. O objetivo era chamar a atenção da sociedade para a necessidade de proteger o que resta da Florestas com Araucária, ou Floresta Ombrófila Mista – uma vegetação típica do bioma Mata Atlântica.

Previamente, o Governo Federal, por meio do Decreto de 19 de maio de 2005, institui o Dia Nacional da Araucária, a ser comemorado no dia 24 de junho de cada ano, definindo que caberá ao Ministério do Meio Ambiente fixar os programas e instruções para as comemorações, adotando as medidas necessárias à efetiva implementação do Decreto.

A Araucaria angustifoliaé uma espécie arbórea característica da Floresta Ombrófila Mista, uma formação que, originalmente, se estendia do planalto gaúcho à Serra da Mantiqueira, ocupando em torno de 200 mil km². Só no Paraná, Estado em que a araucária é símbolo, a espécie cobria 40% de todo o território. Em Santa Catarina, chegava a 30% e, no Rio Grande do Sul, 25%. Desde 2004, no entanto, dados do Ministério do Meio Ambiente (MMA) indicam que, na época, restavam menos de 0,8% de fragmentos em estágio avançado de regeneração desse ecossistema, principalmente, devido ao histórico de exploração econômica de bens da floresta – como e exploração da madeira e da erva-mate –  e sua supressão para atividades agrícolas, expansão de urbanização e reflorestamentos com espécies exóticas, como o pinus e o eucalipto. A exploração madeireira ocorreu de forma preponderante sobre a Araucaria angustifolia, uma das espécies dessa floresta. A intensa exploração madeireira fez o pinheiro figurar como principal item de exportação do Brasil por algumas décadas. Mas a exploração predatória foi capaz de levar a Floresta Ombrófila Mista como um todo ao declínio.

Hoje em dia, a Floresta Ombrófila Mista é um dos ecossistemas mais ameaçados do bioma Mata Atlântica e a Araucaria angustifoliadetém o status de “espécie criticamente em perigo” na lista de espécies ameaçadas de extinção da União Internacional para Conservação da Natureza – na sigla em inglês (IUCN) – e na Lista Vermelha da flora brasileira do Centro Nacional de Conservação da Flora (CNCFlora).

Com esse quadro, em um futuro bem próximo, o desaparecimento Araucaria angustifólia pode virar realidade. A destruição da maior parte da extensão outrora ocupada pela Floresta Ombrófila Mista certamente já levou à extinção diversos componentes da sua biodiversidade original.

No atual momento, de modo absolutamente contraditório, o Ministério do Meio Ambiente – a quem, lembrando, cabe fixar programas e instruções para as comemorações do Dia Nacional da Araucária – brinda a sociedade com o anúncio da revisão de 67 unidades de conservação brasileiras.

Grande parte das listadas ainda conservam, com grandes dificuldades, parcelas da Floresta com Araucária, de Campos Naturais e do bioma Mata Atlântica. Os Campos Naturais representam outro ecossistema associado à Mata Atlântica e que também sofre com a possibilidade de extinção e a ausência de políticas públicas e de condições eficazes para o salvaguardar.

O dia 24 de junho de 2019 vai passar. E passará nos impondo a amarga sensação de que, diante de tantas fragilizações e retrocessos ambientais, por mais que não cesse a disposição e a capacidade para a resistência e a alteração desses cenários tão dramáticos, à natureza brasileira é imposta, cada vez mais, pobreza, violência, agressão, omissão pública e tristeza.

 

 João de Deus Medeiros é biólogo, doutor em Botânica, professor e chefe do Departamento de Botânica da UFSC, conselheiro titular do CRBio-3 e ex-diretor dos Departamentos de Áreas Protegidas e de Florestas do Ministério do Meio Ambiente. Também é parceiro do Observatório de Justiça e Conservação.

 

Este artigo foi veiculado no Plural.

 

 

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