Ao longo dos anos observamos uma sistemática atitude dos governantes brasileiros voltada de forma determinante ao atendimento aos favores aos setores “mais estruturados” da sociedade. Não se trata de comportamento ilícito a busca pelo atendimento de demandas da sociedade organizada. Bem como não representa um crime haver capacidade de organização capaz de influenciar governos ao atendimento de causas específicas. Mas muitas vezes os interesses avançam de tal maneira em busca de vantagens, que passam a agir de maneira propositalmente agressiva, atropelando interesses justos do restante da sociedade.
No caso da exploração dos recursos naturais, esse jogo de favores, tão comum e corriqueiro, tem quase sempre a exacerbação como fator preponderante. A fácil agregação de valor a partir do uso espoliativo e irresponsável da natureza representa uma das formas mais insidiosas de corrupção que podemos constatar ao longo da história. Um prato cheio para o estabelecimento de uma relação incestuosa entre governantes e suas relações com os interesses setoriais, na agricultura, na mineração, em obras de infraestrutura, instalação de indústrias, e assim por diante. A corrupção nasce a partir de empreendimentos pretendidos à revelia do cumprimento das regras lícitas.
Distante de uma ingênua negação da importância das mais diversas atividades econômicas vigentes, essas práticas precisam ser obrigatoriamente delimitadas, sendo que o respeito à lei deveria ser um quesito atendido por todos, sem exceção.
Mais do que isso: o papel do governante tem um pressuposto de alto valor ao lhe ser demandado discernimento e isenção para posicionar-se perante a sociedade sobre escolhas que envolvem interesses distintos. Carecemos de mandatários com essa capacidade. Que consigam defender iniciativas que representem o verdadeiro interesse público, sem que as pressões de atores diretamente beneficiados em postulações distintas imponham suas vontades reiteradamente.
O enorme desafio que envolve conciliar a proteção do meio ambiente com um verdadeiro turbilhão de interesses que usurpam o direito de terceiros, o que inclui as gerações futuras, demanda governantes com sapiência, responsabilidade e caráter. Aqueles que conseguirem superar o desafio de sair do mar de lama que envolve as muitas tomadas de decisão propositalmente equivocadas com as quais temos convivido certamente serão reconhecidos como representantes que honraram suas funções, mostraram ter dignidade e mereceram o respeito da população.
Aqui no Paraná não faltam exemplos que oportunizam o exercício de uma gestão responsável no caso de temas que envolvem ameaças contra o meio ambiente: das discussões sobre o futuro de Pontal do Paraná, o avanço na tentativa de desmonte do Código Florestal, a discussão da lei da caça de animais, a tentativa de extinção do Parque Nacional dos Campos Gerais, o uso indiscriminado de agrotóxicos, o velho caso da Estrada do Colono, os licenciamentos para desmates em floresta com araucária, e tantas outras ameaças.
Não por acaso, estamos em situação tão delicada nos dias atuais. A cooperação dos governantes presentes aponta para o incremento de posturas de entrega sem resistência num caminho de atendimento a favores escusos que vêm sendo traçado ao longo de nossa história.
Com a palavra, os nossos governantes: que mensagem podem nos dar nessa Semana do Meio Ambiente, cercada de ameaças que violentam o nosso patrimônio natural? Vocês vão se posicionar de que forma?
Clóvis Borges é diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) e conselheiro do Observatório de Justiça e Conservação.
Este artigo foi veiculado na Gazeta do Povo.
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