No cenário político atual, a conservação da natureza vem sofrendo reiteradas baixas. Vem sendo difícil alimentar qualquer perspectiva positiva. A cada dia que passa é um novo susto diante das notícias veiculadas. Quando avaliamos o quadro do sistema nacional de unidades de conservação do Brasil, vislumbramos ameaças concretas: redução de recursos financeiros e humanos, propostas de redução de limites e mesmo desconstituição de unidades existentes, assédio a servidores, atropelo aos critérios legais, etc.
Nesse contexto, que justificadamente tem gerado apatia e pessimismo em grande parte da sociedade, foi com grata surpresa que recebemos em Florianópolis (SC), a comunicação de uma iniciativa do Executivo Municipal, visando a construção de uma proposta para a criação de uma nova Unidade de Conservação da Natureza na região centro-norte da Ilha de Santa Catarina.
Convidados pelo órgão ambiental do município (Floram) vários técnicos das universidades locais, de entidades ambientalistas, de associação de moradores, bem como de outros setores do poder público municipal, se envolveram na realização de estudos e levantamento de dados para subsidiar a construção da proposta. A boa recepção dessas contribuições voluntárias – e a grande agilidade do órgão público municipal na sistematização e organização destas informações – mostram-se igualmente dignas de nota.
A partir de algumas oficinas técnicas, elaborou-se uma proposta para criação de um “Refúgio de Vida Silvestre”, procurando abrigar boa parte dos remanescentes de Mata Atlântica existentes ao longo da dorsal centro-norte da Ilha de Santa Catarina. O espaço em questão compõe um corredor natural para a biodiversidade da Ilha. Ao seu redor, estão localizados 16 bairros da Cidade de Florianópolis, nos quais a expansão urbana desordenada também paira como ameaça constante.
A proteção dessa área, portanto, é altamente relevante para a garantia de qualidade de vida e segurança dos moradores da cidade. Em sua maior parte, a área proposta abriga encostas de média a alta suscetibilidade. Nesse espaço, a conservação da vegetação apresenta-se como fator determinante para a sua estabilidade e redução do risco de desastres. Na área também existem diversas nascentes e cursos d’água, essenciais para o desejado equilíbrio climático e suprimento de água para a população. Ela também abriga uma considerável parte da flora, fauna e dos fungos da ilha.
Com área superior a 5.600 hectares, será a maior Unidade de Conservação Municipal. Sua denominação proposta é “Refúgio de Vida Silvestre Meiembipe”. As consultas públicas foram programadas para facilitar a participação da população dos diferentes bairros. Até agora, no total, seis consultas foram realizadas. Registra-se que, mesmo num cenário pouco propício a iniciativas voltadas a proteção ambiental, a participação e retorno da população têm sido bastante expressiva. A novidade vem mobilizando moradores, associações comunitárias e até mesmo vereadores da cidade. O debate mostrou-se rico, com críticas e sugestões diversas, resultando num saldo positivo, com a comunidade recepcionando a proposta como uma importante e necessária iniciativa para o futuro da cidade de Florianópolis.
Encerrada a fase de consultas públicas, o órgão público municipal ficou comprometido com a continuidade do trabalho de ajuste e aprimoramento da proposta, mantendo aberto um canal de diálogo constante com a comunidade. A expectativa é que esse trabalho siga com a agilidade necessária para que, assim que concluída, a proposta seja remetida ao prefeito municipal para que, então, a nova unidade seja finalmente criada. Diante de tantos fatos preocupantes e desestimulantes que predominam em nosso país, ficamos agora na expectativa de que, em breve, teremos boas novas para compartilhar.
João de Deus Medeiros é biólogo doutor em Botânica, ex-diretor dos Departamentos de Áreas Protegidas e de Florestas do Ministério do Meio Ambiente e coordenador geral da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA).
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