Inspirar e expirar; envolver e desenvolver: o caminho para o Litoral

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Assumi a pasta do Meio Ambiente de Paranaguá em janeiro de 2017. Já no primeiro dia de trabalho me surpreendi com o que encontrei no município. Aluguei uma casa no bairro São Vicente, vizinho do Aeroparque, e passei a fazer da gestão ambiental do município nas 24 horas do dia. A partir desse momento, me senti adotado pela “Cidade Mãe do Paraná”. Já no primeiro levantamento sobre as necessidades do município, deparei-me com um histórico de dengue, fruto, muito provavelmente, de uma má gestão histórica da limpeza pública incluindo conceitos estruturais, logísticos, culturais e educacionais.

Iniciado um trabalho de construção de um novo processo licitatório para a limpeza pública da cidade, reorganizamos o calendário de coleta, otimizamos as rotas dos caminhões, fiscalizamos com afinco o contrato atual, trabalhamos com as cooperativas de catadores de materiais recicláveis e com educação ambiental nas escolas e, mesmo assim, a aparência de cidade suja permanecia, gerando relação de amor e ódio da cidade com o Porto de Paranaguá. A maioria dos empregos do município tem ligação direta ou indireta com a atividade portuária. Isso causa a parte do “amor”.

O sentimento de que as duas principais vias de acesso ao Porto e, conjuntamente, ao município trazem a sensação de sujeira e abandono por parte do poder público, por outro lado, gera o “ódio”.
A Avenida Bento Rocha – com obrigação de manutenção por parte do Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Paraná (DER) – que, após anos de descaso, passa agora por reforma e a Avenida Ayrton Senna da Silva – com obrigação de manutenção por parte do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) – transbordam de fertilizantes, soja e outros grãos ou farelos. Parte deles vem do crime de vazada (prática criminosa que ocorre em Paranaguá, na qual as bicas dos caminhões são vandalizadas para roubo da carga e troca da mercadoria por drogas) ou da falta de limpeza adequada dos caminhões. Sem falar no verdadeiro caos que o tráfego dos caminhões causa na cidade, gerando “congestionamentos nível São Paulo” e deteriorações das vias portuárias. Elas nos levam a imaginar uma viagem às crateras lunares.

A falsa ideia de que um porto por si só traz desenvolvimento é uma grande falácia que deve ser combatida. Paranaguá é exemplo disso. Um dos municípios mais belos e ricos em cultura e patrimônio natural e histórico precisa servir de exemplo de que sem “envolvimento” não há o “desenvolvimento”. O sentimento de descaso é comum na população vizinha ao porto. O simples exercício pulmonar de inspiração e expiração já serve como base para percebermos o quanto a atividade portuária pode ser danosa para uma população. O munícipe não ter o direito de pendurar a sua roupa no varal porque ela sairá mais suja do que entrou na máquina de lavar, ou sofrer distúrbios em sua saúde por odores provenientes de atividades com fertilizantes não são condições que possam ou devam ser encaradas como “normais”.

O município que sofre o principal impacto resultado de atividades produtivas como a logística portuária é o que mais necessita do “braço forte” e da “mão amiga” dos entes federativos. Esse debate nos leva a refletir sobre a falsa promessa de desenvolvimento que hoje vemos em Pontal do Paraná, com a iniciativa da construção de um novo porto privado. Os pontalenses devem olhar para o município e discutir “o que é desenvolvimento?”. Que tipo de “progresso” a população espera?

Discuto esse tema com os meus alunos de graduação das disciplinas de Gestão Ambiental em Paranaguá. É preciso despertar na massa estudantil de todo o litoral a criticidade do debate dos problemas do território da bacia litorânea. Os principais cargos do trade portuário precisam ser ocupados por esses alunos que aqui vivem e compreendem melhor onde moram. E hoje, a maioria das pessoas que trabalham para o Porto de Paranaguá “sobem e descem a Serra todos os dias”.

A população deve entender que o papel do Ministério Público é o de preservar o cumprimento das leis e que o das Organizações Não Governamentais (ONGs) é o de auxiliar e cobrar o poder público na resolução dos problemas. Elas não devem ser responsabilizadas por sucessos ou derrotas deste ou daquele grupo político ou de gestões municipais. Precisamos sair de dentro do problema e analisar o todo. Fazendo isso, conseguiremos unir a sociedade para uma verdadeira força-tarefa de valorização de uma das regiões mais belas e importantes do nosso planeta: nosso litoral do Paraná.

 

Raphael Rolim de Moura é biólogo, especialista em Gestão e Planejamento Ambiental e mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Também é professor universitário, e já ocupou os cargos públicos de superintendente de Controle Ambiental e Secretário Interino de Meio Ambiente da Prefeitura de Curitiba. Atualmente, é secretário de Meio Ambiente de Paranaguá.

Acesse este artigo na Gazeta do Povo.

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