Pesquisadores investigam concentração de microplástico no litoral paranaense

Projeto Rebimar usa técnica holandesa para medir presença de partículas nocivas à saúde marinha e humana

Uma rede com pequenas aberturas de 0,3 milímetros, replicada de um modelo holandês de pesquisa marinha, será lançada em sete regiões do Complexo Estuarino de Paranaguá. Nas análises, será possível identificar a concentração de microplásticos em pontos próximos e distantes da faixa costeira, desde Antonina até Pontal do Paraná.

A ação do Projeto Rebimar, que é patrocinado pela Petrobras, começa dentro do barco: uma equipe de técnicos do Rebimar puxa a rede usando a técnica de arrasto na superfície da água. São considerados microplásticos os resíduos de polímeros com tamanho inferior a 0,5 centímetro. Os pesquisadores do Rebimar já sabem que há presença deste tipo de resíduo no litoral do estado, mas querem saber o tamanho do problema.

“Não basta termos o diagnóstico de uma doença. É preciso saber se ela já se alastrou e qual a sua gravidade”, comenta Allan Paul Krelling, professor do Instituto Federal do Paraná e oceanógrafo do Rebimar responsável pela investigação. Krelling já pesquisou a circulação de macroplástico na região, resíduo que mede de 2,5 centímetros a um metro de comprimento, e os impactos econômicos da presença deste resíduo.

Segundo o oceanógrafo, o prejuízo da quantidade expressiva de macroplástico no litoral do Paraná pode chegar a 8,5 milhões de dólares por ano, apenas no município de Pontal do Paraná. “Esta é a quantia que se deixaria de ganhar quando turistas evitam as praias devido à alta presença de lixo na água e na areia. O microplástico, que tem origem na degradação do plástico, traz outras consequências”, afirma.

Depois de quatro meses de preparação, entre parcerias com a Universidade Federal de Pernambuco, que já usa a técnica, e a confecção das redes, as saídas de barco começaram. A coleta de informações não será apenas na superfície da água, mas também nas áreas de sedimentos de fundo, com profundidade de até cinco metros.

“Boa parte dos microplásticos flutuam, mas cerca de 50% deles afundam. Vamos coletar uma ‘fatia’ desses sedimentos para entender o que fica depositado lá”, explica Krelling. Outro ambiente marinho, o mangue, também deve passar por análise, caso as amostragens sejam viáveis.

 

Técnicos do Rebimar coletam amostras de sete pontos diferentes do litoral do Paraná para análise da presença de microplásticos na água (foto: Gabriel Marchi)

 

Microplástico: de onde vem, para onde vai?

De acordo com o oceanógrafo Allan Paul Krelling, há estimativas de que 80% dos resíduos encontrados nos oceanos são de origem terrestre. Os resíduos são carregados pela chuva ou rede de esgoto aos rios. Como o sistema de saneamento básico não é capaz de filtrar microplásticos, o material é despejado no mar.

O impacto de pequenos plásticos no mar já era alerta de vários cientistas à população na década de 1980. Um dos grandes problemas está na criação dos nibs, como aponta o professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo e conselheiro da Associação MarBrasil, Frederico Brandini.

A indústria petroquímica se inspirou no tamanho dos grãos de soja para transporte em navios ao criar os nibs, pequenos pedaços de plástico que, uma vez derretidos, servem a outros setores da indústria para criar qualquer utensílio de plástico.

O problema está na logística. Assim como vemos milhões de grãos de soja à beira de estradas e outros incontáveis são perdidos no transporte pelo mar, o mesmo ocorre com os nibs. A diferença é que os grãos de soja são orgânicos e se decompõem, enquanto os nibs de plástico se depositam e viajam pelos oceanos.

Brandini afirma que este processo já contaminou todo o planeta. “Qualquer praia do mundo tem nibs, mesmo uma ilha oceânica distante e áreas marinhas protegidas, como as unidades de conservação”.

 

Na foto 1, amostra da água marinha coletada em junho deste ano. Na foto 2 é possível ver um microfilamento de plástico retirado de área de manguezal no litoral do Paraná. Segundo especialistas, presença de microplásticos é sinal de alerta marinho e terrestre (fotos: Gabriel Marchi (1) e Allan Paul Krelling (2)

 

Segundo o professor, este plástico também se decompõem, como outros, ao receber raios ultravioleta. “Boiando no mar, em poucos dias estes pequenos resíduos são colonizados por bactérias, que dão à partícula o cheiro de comida”. Ele explica que os animais marinhos são orientados pela audição e olfato, sendo vítimas do falso alimento. “Se você jogar um pedaço de plástico na frente de uma tartaruga, ela não vai abocanhá-lo. Mas se o mesmo pedaço ficar uma semana no mar, a mesma tartaruga vai ingeri-lo”.

Contaminação marinha e humana

Durante as entrevistas com os especialistas costeiros, Allan Paul Krelling lembrou de pesquisas que já detectaram nanoplásticos na placenta humana. Frederico Brandini recorda investigações que alertam sobre a presença de microplástico no sal de cozinha.

Camila Domit, bióloga do Centro de Estudos do Mar, afirma que o microplástico causa um “efeito cascata” na biodiversidade marinha que atinge a nós, humanos. “Os animais que estão na base da cadeia alimentar no fundo do mar ingerem microplásticos, como os poliquetas, que são as minhocas do mar. Os poliquetas servem de comida para peixes, que são ingeridos por peixes maiores, e assim por diante. É exatamente assim que o microplástico vem parar na gente”, ilustra a bióloga.

A pesquisa do Projeto Rebimar deve colaborar para outras descobertas futuras do meio ambiente marinho, como tipos de plástico presentes na região, alcance destas partículas e prejuízos à fauna. Os primeiros resultados são esperados no fim deste ano.


 

O Programa Rebimar é um conjunto de ações socioambientais voltadas para a conservação da região litorânea, principalmente no Paraná e na costa sul de São Paulo. A iniciativa faz parte da Associação MarBrasil, tem patrocínio da Petrobras e conta com apoio científico do Centro de Estudos do Mar da Universidade Federal do Paraná e do Instituto Federal do Paraná.

 

 

 


 

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